Pequenos Contos: O Caracol veloz
Era uma vez um caracol demasiado veloz para os seus tempos. Tal como se costuma dizer “andava a mil” só porque gostava de ser difícil! Ora, assim, era difícil de apanhar, era difícil de enganar e, sobretudo, era difícil de agradar. Era no fundo um caracol muito senhor do seu nariz e não havia quem o fizesse feliz!
Quando ainda era um petiz gostava de ler, de escrever e de correr...de correr? Bem, é como quem diz, de deslizar dois passos mais à frente que os seus amigos. Gostava de pensar que aquele era o seu lugar: à frente do seu tempo e dos seus colegas era onde mais gostava de estar.
Não gostava de esperar, aborrecia-o pensar que estava a perder tempo quando já podia estar mais à frente; assim fazia sempre por ser o primeiro! O primeiro a acordar, o primeiro a adormecer; o primeiro a lanchar e o primeiro a correr! Lá estamos nós outra vez...não pode ser...um caracol não consegue correr! Consegue deslizar um pouco mais depressa, pois, certo dia, fez a si próprio a promessa que haveria de ser atleta e haveria de aprender a andar de bicicleta!
Adormecia, ainda era dia, e acordava, de madrugada, ainda a Lua não estava deitada. Assim, certo dia, digo, certa noite, resolveu meter conversa com a Lua julgando que ela não o ouvia, mas mal ele sabia!
- Ó Lua, ó Lua maravilhosa, se viesses cá abaixo dava-te uma rosa!
Esticou o peito todo orgulhoso por conseguir ser tão charmoso e qual não é o seu espanto quando ouve uma voz feliz que lhe diz:
- Ora, ora, que oferta tão generosa, estou certa que consegues enviar a rosa, se quiseres!
- Quem és tu? – questionou incrédulo o caracol.
- Sou a Lua! Sou aquela que dá a todos o luar, sou aquela que vos vê sonhar, mas tu não sonhas...és sempre o primeiro a acordar!
- Sonho pois! – diz altivo o caracol. – Sonho em ser o primeiro a ler, a escrever, a correr...
- E és feliz? Sentes alegria no teu coração? – quis, então, saber a Lua. – Tens amigos com quem falar? Tens amigos com quem brincar?
O caracol ficou pensativo; ele que até era tão assertivo...de repente, faltaram-lhe as palavras...
- Bem, sou o primeiro...- balbuciou o caracol.
- Tens que saber sonhar, tens que conquistar a amizade, tens que ter vontade de olhar em teu redor, observar e participar nas conversas, nas festas, na troca de olhares, na emoção de teres uma paixão...
A Lua falava com tal entusiasmo que o caracol ficou pasmo!
De repente, percebeu porque ninguém o convidava para passear (pois ele tinha que ser sempre o primeiro a terminar), ninguém o convidava para conversar (pois ele tinha que estar sempre a falar e nunca a escutar), no fundo, ninguém o convidava para nada...
- Eu posso ser tua amiga, se quiseres! – disse gentilmente a Lua.
E foi, assim, que, a partir daquela madrugada, uma nova amizade nasceu.
O Caracol percebeu como era bom não apenas falar, mas também escutar e, todas as madrugadas, aguardava que a sua amiga viesse sussurrar-lhe ao ouvido todas as emoções que tinha vivido.
Os restantes caracóis ficaram espantados com a simplicidade do nosso caracol e pensaram que tinha enlouquecido, mas, depressa, perceberam que não, que apenas se tornou num verdadeiro amigo. Passou a saber escutar, a saber sorrir, a saber acompanhar e, até, abraçar. Vejam só que, certo dia, o Caracol percebeu o que era a paixão quando viu uma linda caracol a apanhar sol ao portão. Podem imaginar que nada ficou igual e, a partir daquela madrugada, não era apenas um, passaram a ser dois a partilhar o luar.

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