A menina que vivia nas nuvens


    Jandira, ainda de tenra idade, ajudava como podia na sua casa. Morava numa casa modesta com os seus pais e os seus quatro irmãos. Por ser a segunda filha do casal crescera depressa para ajudar a sua família, afinal os pais tinham que trabalhar e, naquela ilha, ter um emprego era quase como encontrar uma agulha num palheiro. Bem, Jandira já procurara uma agulha num palheiro e nunca a tinha encontrado pelo que não entendia muito bem o que os adultos queriam dizer. Será que algum deles, algum dia, teria encontrado uma agulha num palheiro? Essa era uma das questões que tinha colocado na sua lista de questões mental. Divertia-a pensar que, daí a uma semana, quando fosse para a escola iria saber a resposta para todas as suas perguntas...e se eram muitas! Até esse dia chegar, tinha de tomar conta dos seus três irmãos mais novos. 

      O seu irmão Tomé, dois anos mais velho do que Jandira, já tinha ido para a escola mas, nas férias, ajudava sempre os avós na venda do artesanato. Ela tinha que ficar em casa, dar a sopa aos irmãos e cuidar deles para que nenhum se magoasse. Bem que gostaria de poder ir também ajudar os avós...era bem mais divertido ver aquelas tartaruginhas coloridas, aqueles búzios pintados e todos aqueles colares, anéis e lenços esvoaçantes que faziam a delícia dos turistas. De vez em quando, o Tomé ganhava uma moeda dos turistas! Ah, se um dia pudesse também ela ganhar uma moeda...já sabia o que fazer! Não a ia gastar como o Tomé fazia: tudo em pastilhas! Bem, não era assim tão mau porque ele era generoso e dava-lhe sempre uma pastilha de morango! Mas ela compraria um caderno e um lápis para levar para a escola!

      Certo dia, a mãe disse-lhe que "estava de folga"...oh, palavras mágicas!

      - Posso ir ajudar os avós na loja do artesanato? - perguntou meio receosa a menina.

      - Podes - disse-lhe a mãe - mas não atrapalhes e não aborreças ninguém! 

      Ainda a mãe não tinha bem terminado e já Jandira saia disparada atrás do Tomé. Não lhe custou fazer o percurso, apesar do sol escaldante que já se fazia sentir. Nem reparou nos burros selvagens que se passeavam pela ilha, nem notou o ondular leve que o mar trazia naquele dia, nem sequer na alegria das gaivotas que rondavam os barcos de pesca. Em pouco tempo, alcançaram a vila e dirigiram-se à loja dos avós. 

      A avó recebeu-os com um beijo sonoro em cada bochecha e o avô estava no seu cantinho a olhar o mar e a bebericar uma chávena de café. Estava sempre bem disposto e ficou muito feliz de ver os seus netos a chegarem. Tomé, já acostumado à rotina da loja, foi, de imediato abrir caixotes e arrumar as tartarugas nas prateleiras. Jandira olhou à sua volta na expectativa de se fazer útil mas não sabia por onde começar...

      - Menina, podes ajudar-me aqui?

      Jandira voltou-se e viu uma senhora elegante (bem, parecia estar na capa de uma revista...daquelas revistas que a tia Marlene colocava no seu cabeleireiro e só a deixava folhear quando já se tinha passado um mês e as clientes lhe tinham perdido o interesse...). De um fôlego só disse:

      - Sim? Em que a posso ajudar?

      - Estou à procura de uma peça especial, sabes? Quero oferecê-la à minha filha. Ela adora tartarugas!

      - Eu também gosto muito! Há alguns dias, o meu pai levou-me para vê-las a porem os ovos na praia! Foi muito giro! E sabe? Daqui por uns meses, nascem os filhotes e vão diretamente para o mar...

      - És uma miúda muito perspicaz! Tenho a certeza de que me consegues ajudar. - disse a senhora simpática esboçando um sorriso. 

      Jandira matutou rapidamente no que quereria dizer "perspicaz" mas não se preocupou, apenas a adicionou essa palavra à sua longa lista de e conduziu a senhora ao canto mais colorido da loja. Aí, escolheu a sua tartaruga de eleição e a senhora ficou deslumbrada. Antes de se despedir, a senhora puxou de uma nota e deu-a à Jandira, dizendo:

      - Para que possas comprar uma guloseima, minha querida.

      Jandira abriu muito os seus olhos castanhos e esboçando um grande sorriso, segredou-lhe:

      - Sabe, daqui a uma semana eu vou para a escola e já tenho uma lista grande de perguntas e palavras para perguntar à professora. Com esta nota vou poder comprar um caderno e um lápis e escrever tudo! Hoje, foi o meu dia de sorte!

      Jandira vivia numa ilha árida banhada por um mar aventureiro; era uma criança feliz, cheia de sonhos e de uma generosidade imensa. Cantava, dançava, brincava e sabia o valor das pequenas alegrias; daquelas que a faziam acreditar num futuro que construiria para si, um futuro que a levaria a viver nas nuvens!

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